quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Macau, ou Àomén, as metamorfoses de uma cidade de culto

Os primeiros mercadores e jesuítas portugueses desembarcaram em Macau no século XVI. Nessa altura, os pescadores e agricultores que aí viviam chamavam à sua terra Ou Mun (Porta da Baía), por esta se localizar na foz do Rio das Pérolas, ou A-Má Gao (Baía de A-Má). Uma lenda local conta que um humilde pescador levou A-Má, uma linda rapariga, para Cantão; durante a travessia, o barco onde seguiam foi o único poupado à fúria da tempestade. Quando finalmente chegaram a Macau, A-Má desapareceu para surgir, pouco tempo depois, transformada numa deusa. Nesse lugar foi construído um templo em sua honra. Ainda hoje é possível visitar o Templo de A-Má, à entrada do Porto Interior, que continua a ser um lugar de culto para muitos macaenses e chineses. Em várias partes do Sudeste Asiático, a deusa A-Má é considerada a protectora dos pescadores e marinheiros. Desde Julho de 2005 que o Templo de A-Má, juntamente com as Ruínas de São Paulo, faz parte do Património Cultural da Humanidade da UNESCO.
Durante os 450 anos seguintes após a chegada dos portugueses, o território, hoje com uma área total de quase vinte e oito quilómetros quadrados, compreendendo a ilha da Taipa e de Coloane, esteve sob a administração portuguesa. Em 1999, ano da transferência da soberania, Macau passou a fazer parte da República Popular da China, auferindo do estatuto de Região Administrativa Especial e, como a vizinha Hong Kong, passou a beneficiar do princípio “um país, dois sistema”.
Para quem hoje visita Macau, a presença portuguesa está um pouco diluída, mas continua presente, em especial no património artquitectónico e cultural. Depois de uma visita ao templo de A-Má e ao Museu Marítimo ali bem perto, percorrer o emaranhado de ruas até chegar ao coração simbólico de Macau - o Largo do Senado - é uma experiência inolvidável. A estação central dos correios, a Santa Casa da Misericórdia e o Leal Senado são alguns dos edifícios da época colonial que fazem do Largo do Senado um dos lugares mais procurados pelos turistas. A calçada típica portuguesa que torna este largo um dos mais carismáticos da cidade é invadida durante todo o ano por variadíssimos eventos culturais e artísticos que o dinamizam e envolvem de luz e cor. As muitas casas de pasto que se escondem sob as arcadas convidam a provar a rica gastronomia macaense que é fruto da fusão das cozinhas portuguesa, chinesa e indiana.
A um passo do Largo do Senado encontramos a Fortaleza do Monte, construída no ano de 1616, que albergou a primeira colónia portuguesa. Actualmente os seus canhões apontam a uma cidade em constante evolução, onde conflui o moderno e o antigo. Da Fortaleza vê-se o que resta da Igreja de São Paulo, destruída em 1835 por um grande incêndio; da antiga igreja barroca onde se diz estar esculpida a história da religião católica na Ásia já só resta a fachada ao cimo de uma imponente escadaria. Vale a pena visitar o Museu de Macau que, através de réplicas e quadros explicativos, nos dá uma visão da presença portuguesa no Oriente.
É sempre um prazer para os sentidos passear pela Avenida da Praia Grande, apesar de algumas alterações impostas pela necessidade de requalificação do espaço urbano. De entre todas as construções coloniais que ladeiam a Avenida, é indispensável espreitar a antiga Residência do Governador que, infelizmente, não está aberta ao público.
Outros lugares de visita obrigatória são: o Templo de Na Tcha, o Templo de Sam Kai Vui Kun, símbolo da arquitectura tradicional chinesa, o Templo Tai Soi, popular entre as mulheres que o visitam com oferendas à Deusa da Fertilidade, as Portas do Cerco, o Quartel dos Mouros e o Forte da Guia, construído em 1637, que permite uma das mais espectaculares vistas sobre a cidade, só superada pela moderna Torre de Macau, com 338 metros de altura. Esta torre, visível de toda a península, permite vislumbrar as ilhas em redor de Hong Kong nos dias mais límpidos.
Macau aposta em particular no turismo e no jogo; estas são afinal as duas actividades que garantem a sustentabilidade da região, por isso oferece uma recheada agenda cultural e artística, assim como um extenso calendário de festas. Desde a gastronomia ao golfe, passando pelas artes e desporto, a cidade anima-se durante as 24 horas do dia todos os dias do ano.
Bares e pubs com música ao vivo e karaoke, discotecas com música internacional e música cantada em cantonense e mandarim, restaurantes de cozinhas de outras partes do mundo, acessíveis a todas as bolsas, e muitas lojas de comércio mantêm durante toda a noite as portas abertas para um público ávido de diversão.
São muitos os casinos em Macau e na Ilha da Taipa que aliciam com o sonho do dinheiro fácil. Se quisermos arriscar algumas patacas, o casino do mítico Hotel Lisboa é uma opção interessante; este hotel dispõe, ainda, de áreas de restauração, comércio e espectáculos de cabaré, ao bom estilo parisiense. As corridas de galgos e as corridas de cavalos podem ser uma alternativa para quem queira tentar a sorte, ou simplesmente para passar o tempo de forma emocionante.
Sendo uma cidade que se esmera na arte de bem receber, Macau moderniza permanentemente as suas infra-estruturas, levando a que grandes cadeias hoteleiras, como a Hilton Hotels Corporation, o grupo Malásia Sgangri-la Hotels and Resorts, o Four Seasons Hotels and Resorts, o Accord/Sofitel, entre outros, invistam no território, criando acomodações de lazer e bem-estar que tornam este destino um dos mais apelativos do mundo.
O Macau Golf and Country Club, perto da praia de Hac-Sá, na Ilha de Coloane, é um exemplo de um dos grandes investimentos feitos na península para atrair entusiastas de todo o mundo. Contando com a presença de alguns dos maiores nomes deste desporto, o “Open de Golfe de Macau” faz já parte do circuito internacional de golfe e é uma oportunidade de excepção para os praticantes da modalidade se confrontarem e desenvolverem as suas técnicas ao lado dos melhores a nível mundial.
Se quisermos fugir ao ritmo acelerado da cidade, podemos programar um dia calmo em contacto com a natureza. A maioria dos jardins públicos prima pela harmoniosa conjugação de elementos do Ocidente e do Oriente, criando assim espaços ideais para ensaiar alguns movimentos relaxantes de Tai chi. Acordemos cedo e tentemos que um dos muitos praticantes de Tai chi nos ensine alguns movimentos ‘mágicos’ desta arte marcial tradicional chinesa. Depois de um pequeno-almoço regenerador, lançamo-nos numa caminhada através das colinas da Ilha da Taipa e da Ilha de Coloane, onde existem trilhos seguros que oferecem vistas magníficas sobre o rio. De regresso à cidade, damos uma volta de riquexó pela baixa e, depois de um Spa, onde podemos recuperar as energias, terminamos o dia num restaurante da Rua da Felicidade (onde no passado se localizavam as casa de consumo de ópio e de outros prazeres) e deliciamo-nos com uma sopa de barbatana de tubarão, logo seguida de porco agridoce, não esquecendo o arroz, e a acompanhar, um chá de jasmin (“Heong pin t’chá”) ou um chá vermelho (“Pou lei”).
Nas praias de Hac-Sá e de Cheoc Van, na Ilha de Coloane, os amantes dos desportos náuticos têm a possibilidade de passar momentos estimulantes; praticar windsurf, ter aulas de vela, alugar motas de água ou simplesmente nadar nas suas águas mornas. Os areais são rodeados por diversos locais de lazer que se escondem no meio da vegetação; restaurantes chineses e portugueses, parques para piqueniques, espaços especialmente pensados para as crianças e cortes de ténis, tudo para receber com elevados padrões de qualidade turistas e veraneantes exigentes.Cumprindo a sua vocação de cidade portuária, Macau tem sido ponto de partida e de chegada de muitas culturas e tradições e uma ponte de interligação entre o Oriente e o Ocidente. A coexistência harmoniosa das várias comunidades residentes e a convergência de valores, crenças religiosas, costumes, hábitos, tradições e estilos arquitectónicos fazem de Macau um lugar tolerante e único no mundo.
In: Revista "FrontLine", Outubro, 2008

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